Quem são os Stakeholders?

Uma metáfora para entender como os stakeholder afetam o escopo.

ARTIGO

Sempre que uma iniciativa tem chance de se tornar um projeto, logo uma voz grita do fundo da minha consciência (um lugar que fica mais ou menos entre a nuca e o tímpano direito): “-PRECISAMOS FECHAR O ESCOPO DO PROJETO!”

O tal projeto pode ser o desenvolvimento de um sistema, a viagem das férias de fim de ano, a construção de uma casa… não importa: minha mente já condicionada pelo Guia PMBOK de Gerenciamento de Projetos me diz que é preciso “fechar” o escopo.

E fechar o escopo, neste caso, é um pouco parecido com fechar uma caixa ou uma gaveta no sentido de que depois que se fecha, coisas ficam fora e outras ficam dentro. Fechar o escopo significa delimitar uma lista de “coisas” que estão dentro. Essas “coisas”, segundo a minha pobre mente também já condicionada por outro Guia, o BABOK de Análise de Negócios (às vezes questiono se ainda sou capaz de ter alguma idéia própria), são requisitos que devem ser elicitados, ou em outras palavras, levantados, investigados ou trazidos à tona.

Pergunta: Como começar a elicitação dos requisitos?

Resposta: Identificando os Stakeholders.

Stakeholder é um termo bonito e que está na moda, mas na verdade muita gente tem dificuldade em saber quem realmente faz parte desse grupo. Na tradução do BABOK para a língua portuguesa acabamos por seguir a mesma tradução que o pessoal do PMI usou no PMBOK e traduzimos stakeholder como “partes interessadas”. Embora a tradução seja hoje a mais usada no mercado, acredito que ela não ajuda muito a entender a real importância de identificar essa turma.

Andei pesquisando a origem da palavra e pela tradução literal acabei chegando a uma imagem que tem me ajudado muito a entender e a identificar os stakeholders. Siga o meu raciocínio:

Do inglês:

HOLD = SEGURAR (por consequência, HOLDER = quem segura)
STAKE = ESTACA (quem achou que era bife se enganou! Bife = STEAK)

Portanto minha conclusão óbvia: o stakeholder é um “segurador de estaca”.  Sei que a princípio isso não parece nada genial, mas acompanhe a minha visão e veja como ela pode ajudar.

Imagine que a prefeitura está precisamos delimitar terrenos em um novo bairro de sua cidade. Já viu como os terrenos são delimitados? São usadas estacas de madeira em cada vértice do polígono que forma a área do terreno. Agora imagine que para escolher a área de terreno dos seus sonhos você pede ajuda para sua família. Cada um vai segurar uma estaca e se posicionar em um determinado ponto do terreno. Para facilitar ainda mais a visualização do perímetro, você amarra um elástico de uma estaca a outra, de modo que toda vez que sua mãe ou sua irmã dão um passo para frente ou para trás o tamanho do terreno diminui ou aumenta.

Visualizou? Pois então agora veja a minha definição de stakeholder: “são todos aqueles cujo posicionamento afeta o escopo”. São eles os donos dos requisitos e é por isso que o processo de elicitação deve iniciar identificando os stakeholders.

Vamos supor que o projeto seja a construção de uma casa para você morar. Stakeholder é qualquer pessoa ou entidade que tem requisitos para essa casa:

  • Sua esposa (ou marido) certamente tem uma série de expectativas com relação ao estilo e ao tamanho da casa.
  • Seus filhos têm necessidades que a casa deve atender: o número de quartos, área de lazer, segurança. Veja que mesmo que seus filhos ainda não tiverem nascido e estiverem somente na intenção, eles já são stakeholders.
  • Sua empregada também tem necessidades que irão definir as funcionalidades da área de serviço e deixar de fora do escopo aquela linda pia reflexiva que vai ficar fosca se ela limpar com Bombril.
  • A prefeitura tem uma série de exigências que precisam ser atendidas ou você não conseguirá o alvará de construção ou a certidão de Habite-se.
  • Outros prestadores de serviços também trarão uma série de requisitos para a construção de sua casa: a companhia de energia elétrica, de saneamento, de telefonia, de tv a cabo…

Deixar de identificar qualquer um desses “seguradores de estaca” significa que você não está visualizando todo o escopo e que alguns requisitos vão ficar de fora, ou seja, não serão entregues pelo projeto. Contudo, embora você não os tenha identificado, eles estão lá, e provavelmente serão foco de uma mudança de projeto num estágio mais adiante ou de um novo projeto de melhoria para cobrir os requisitos que não haviam sido identificados na construção.

Cuidado com isso! Procure identificar todos os stakeholders o quanto antes. Fica muito mais caro atender a uma norma da prefeitura de adequar a distância de recuo para a casa do vizinho depois que a casa já está construída.

Assim como a prefeitura, considero que o Fisco, o INSS e os sindicatos também estão lá com suas estacas. Se você não os perceber, eles vão ficar de fora do perímetro de sua análise de requisitos e vão aparecer somente lá na frente com suas exigências. Nessa hora não dá para alegar que o escopo mudou e que são exigências novas. Esses stakeholders sempre estiveram lá e isso sempre deveria ter feito parte do escopo. Só não haviam sido identificados.

É claro que o escopo do projeto não é totalmente identificável de início e será progressivamente elaborado e detalhado durante repetidas iterações (Contribuições do amigo Cláudio Kerber). Não acho que depois que você fechar a caixa precisa jogar a chave fora. Pode mudar depois. Mas a cada planejamento é preciso trabalhar com um escopo fechado. Pode ser cheio de incertezas e suposições que irão se confirmando no meio do caminho. Se não se confirmarem, o escopo é reavaliado e renegociado. Pode-se também trabalhar com planos mais curtos em pequenas entregas. Mas, entendo que cada entrega deve ter um escopo fechado.

O fechamento do escopo não deve ser visto como uma limitação ou uma restrição que não pode ser transposta. Mas como um entendimento combinado sobre o que faz parte de uma iniciativa para que se permita o planejamento das ações necessárias. Esse entendimento cria um acordo claro entre os stakeholders que deve ser continuamente revisto e validado a cada iteração.

Outro ponto importante e que não pode ser deixado de lado (contribuição do Jefferson Anselmo) é que, embora minha metáfora tenha se limitado a dimensão escopo, os stakeholders irão também influenciar as outras dimensões do projeto como o prazo, o custo, os riscos, as oportunidades, os recursos… Por isso mesmo, é bom começar a elicitação identificando com cuidado quem segura uma estaca para o seu projeto.